Opinião Orlando Silva – Café: As exigências sanitárias do Japão revisitadas

Orlando Monteiro da Silva*

Em 2015, um artigo avaliou as notificações sanitárias (SPS) e técnicas (TBT) enviadas à Organização Mundial do Comércio (OMC), sobre as exigências dos países para a importação do café. Utilizando a classificação de quatro dígitos do Sistema Harmonizado de classificação de mercadorias (HS 0901), que corresponde ao café em grãos, foi mostrado que entre os anos de 1995 e 2014 foram emitidas 22 notificações técnicas e 99 sanitárias e fitossanitárias. O Japão, sozinho, emitiu 49 das notificações sanitárias, que correspondiam a quase 50% daquele total. As justificativas utilizadas foram sempre as da saúde humana e da segurança alimentar, com a imposição de limites máximos aos resíduos (LMR) de agrotóxicos. Passados nove anos, essa nota mostra como tem sido a evolução das notificações daquele país e o que mudou ao longo desse período.  

De janeiro de 2015 a dezembro de 2022 o Japão emitiu outras 203 notificações SPS e nenhuma notificação TBT para o café em grão.  Isso corresponde a quase cinco vezes o número de notificações emitidas nos 20 anos anteriores e reforça a tendência crescente na emissão de notificações que tem sido verificada mundialmente. Destas, 34 foram notificações Addendum, que acrescentam alguma coisa em notificações já existentes; duas Corrigendum, que fazem alguma correção; e cinco, Revisões, que trocam ou alteram o escopo das notificações.  Com exceção de alguns poucos casos, nos quais o país especifica as exigências quarentenárias e a necessidade de fiscalização das exportações no país de origem, todas as demais notificações dizem respeito aos limites máximos de resíduos de produtos químicos no café. Em 96 casos, aquele país adotou um LMR de 0,01 ppm (partes por milhão, ou miligramas de resíduos de agrotóxicos por quilograma de um produto).  No Japão, uma Fundação de Pesquisa Química Alimentar faz a revisão periódica dos LMR de todos os produtos agrícolas e alimentares. Ela assume o valor máximo de 0.01 ppm para qualquer resíduo químico em produtos cujos LMR não tenham ainda sido estabelecidos, além de proibir sua importação e distribuição. Talvez por isso, a grande frequência desses limites. Ocorreram reduções dos LMR em 33 notificações e aumentos em outros 70 casos.

O Japão é conhecido como um modelo mundial de dieta saudável e que tem adotado limites cada vez mais rigorosos de resíduos de agrotóxicos nos alimentos. Em nível internacional a fixação de LMR é função do Codex Alimentarius, comissão conjunta da FAO (Órgão das Nações Unidas para a agricultura e alimentação) e da Organização Mundial da Saúde (OMS) e reconhecida como órgão harmonizador dessas normas. Contudo, o Codex não tem conseguido fixar limites de resíduos de agrotóxicos para muitos princípios ativos e produtos. Isso provoca interpretações diferentes pelos países e os estimula a estabelecer limites mais rigorosos e divergentes, o que, consequentemente, gera mais conflitos nas relações comerciais. A possibilidade dos LMR se tornarem barreiras ao comércio do café exige, portanto, o conhecimento prévio e uma avaliação constante dos mesmos, para que as exportações não sejam prejudicadas. 

* Professor colaborador/voluntário da UFV. Mestrado em 1979 pela UFV e Doutorado em 1990 pela North Carolina State University. Atua em barreiras não alfandegárias e comércio internacional, demanda e interdependência de mercados, métodos quantitativos em economia e comércio internacional de commodities agrícolas.